Contexto
Weber acompanhou atentamente às transformações de seu tempo, como o desenvolvimento industrial dos países europeus, as mudanças sociais e econômicas nas Américas e as mudanças colocadas pela Revolução Russa, de 1917. Preocupado com os rumos da política na Alemanha e interessado pela condução do Estado de tipo moderno, Weber acabou por desenvolver dentro de sua sociologia uma teoria política, que tinha como centro o conceito de “dominação”. É na conferência realizada em 1919, Politik als Beruf (Política como vocação, ou Política como profissão, dependendo do intérprete), que Weber apresenta essa ideia de forma sintética, tratando da importante distinção entre as relações de poder e autoridade e as relações de dominação com base em legitimidade.
Distinção entre Poder e Dominação
Em termos de uma teoria sociológica, Weber (2010a; 2011[1919]) entendia que seriam tantas as maneiras de alguém ser levado a ocupar uma posição de mando, que seria praticamente impossível obter uma compreensão, mesmo que tipológica, do fenômeno. De modo que ele compreendeu a necessidade de uma distinção entre a ideia de poder e a de dominação, diferenciando, também, poder legítimo e ilegítimo, sendo que essa legitimidade pode ser estabelecida por meio de um arranjo de valores ou pela racionalidade prática, assim, a dominação figura como a capacidade de alguém encontrar obediência ao seu mando e ordem. O olhar de estranhamento que Weber lança sobre a condução da vida política não está endereçado diretamente ao poder, mas à dominação legítima, que é essencial para a estabilidade e continuidade das estruturas de poder. A sutileza revelada é de que a obediência nem sempre vem da imposição. Se no caso exercício do poder pelo poder pode haver coerção e imposição, no caso da dominação há aceitação e legitimação. O que está no centro das indagações de Weber é justamente entender os mecanismos sociais, “justificações internas” e “meios externos” (Weber, 2011, p. 68), que levam os indivíduos a reconhecerem (legitimar) e obedecer a autoridade da dominação. A dominação não ocorre sempre de maneira harmônica, a aceitação e legitimação deste domínio estariam fortemente associadas ao sistema de sentido atribuído pelos indivíduos agindo socialmente e pode, igualmente, “ser condicionada por outros interesses e muito variados (sic)” (Weber, 2011, p. 69).
Os tipos de dominação
Weber ampliou a compreensão das relações sociais nas sociedades modernas ao considerar a dominação para além das instituições formais ou legais e identificou (Weber, 2015c) três tipos de dominação legítima — como tipos ideais que não ocorrem nesse estado puro na realidade social. São eles: tipo “tradicional”, tipo “carismático” e tipo “legal-racional”. Esses tipos servem como ferramentas analíticas para a compreensão das diversas formas de autoridade encontradas nos sistemas sociais e políticos.
Dominação Legal-Racional (crença na validade da Lei); A dominação legal-racional é a forma mais racionalizada, baseada em regras, procedimentos e estruturas legais formais (como a burocracia). A autoridade é legitimada através de princípios jurídicos racionais, como códigos legais, constituições e regimentos burocráticos. Nas sociedades burocráticas modernas, o poder é normalmente atribuído a funcionários, burocratas nomeados e estruturas institucionais governadas por leis e regulamentos. Weber destaca a racionalização e a burocratização da autoridade como traços característicos da modernidade, enfatizando o papel das normas racionais-legais mundo social e na organização da ação coletiva.
Dominação Tradicional (crença na validade da tradição): enraizada em costumes, normas e estruturas familiares ou hereditárias de longa data. A autoridade é legitimada com base em precedentes históricos e na santidade da tradição. Nas sociedades tradicionais, o poder é frequentemente atribuído a figuras patriarcais, governantes hereditários ou líderes religiosos cuja autoridade deriva de práticas e crenças culturais. Weber destaca o papel da tradição na estabilização da ordem social e na manutenção da continuidade através das gerações.
Dominação Carismática (crença nos dons pessoais de determinado indivíduo): a forma menos racionalizada, move-se pelas qualidades pessoais excepcionais e do apelo pessoal de um líder carismático. A autoridade carismática surge quando os seguidores são inspirados e cativados pelo carisma extraordinário de um líder. Os líderes carismáticos desafiam frequentemente as normas e instituições estabelecidas, confiando no seu magnetismo pessoal para mobilizar seguidores e efetuar mudanças. Weber (2010b) identifica a autoridade carismática como inerentemente instável, sujeita a flutuações e dependente da presença contínua do líder carismático.
Aplicação
A tipologia de dominação de Weber fornece uma estrutura para analisar as diversas formas de autoridade encontradas em contextos sociais, políticos e religiosos, e demarca pontos de análise factíveis dentro da complexa dinâmica de poder e autoridade na ordem social. A sua tipologia sublinha a natureza contingente da autoridade, destacando como diferentes contextos históricos e culturais dão origem a modos distintos de dominação (Schluchter, 2104b). A dominação deriva diretamente da ação social e da relação social orientandas para fins ou objetivos específicos. A legitimidade é um componente intrínseco à dominação, pois a estrutura de dominação é formada pela ação de indivíduos que, ao legitimarem esta autoridade, contribuem para a manutenção do sistema de poder dominante.
Referências Bibliográficas
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Weber, M. A Política como vocação. In: Weber, M. Ensaios de sociologia. Gerth, H. H.; Wrigth–Mills, C. (Orgs.). Dutra, Waltensir (Trad.). 5. ed. [reimp.]. Rio de Janeiro: LTC, 2010a. p. 97–153.
Como citar este verbete:
CARVALHO, Marcio J. R. de. Dominação: Verbete. In: Enciclopédia Max Weber. 2024. Disponível em: https://www.enciclopediamaxweber.org/%C3%ADndice-geral-de-entradas/domina%C3%A7%C3%A3o Acesso em: dd.mm.aaaa.