Definição
Se tomarmos em termos simples, conforme a tradição explicativa vigente, Max Weber, enfatizou que a “objetividade” estaria baseada em três conceitos principais: o método compreensivo; os tipos ideais; e aquilo que recorrentemente, e de forma equívoca (Sell, 2020), tem sido chamado nas ciências socias brasileiras de “neutralidade axiológica”, uma conduta epistemológica de “distanciamento”, na qual o cientista social reconhece seus próprios valores e crenças, mas se esforça para não os deixar afetar sua análise. Contudo, esse “distanciamento” não significaria ausência completa de subjetividade. De modo a romper com o positivismo, Weber reconhece que o cientista social não pode se desvincular completamente de seus valores. Portanto, não se trataria de neutralidade irrestrita, absoluta, mas sim um esforço consciente para compreender os fenômenos sociais de maneira imparcial, considerando a subjetividade a partir de critérios que permitam uma busca consciente pela apreensão do objeto de estudo em sua realidade concreta.
Aplicação
A distinção weberiana entre juízo de fato e juízo de valor nas ciências sociais o é a base da “neutralidade” axiológica, garantindo objetividade e imparcialidade na pesquisa científica nas ciências sociais. Weber defendeu que os cientistas sociais devem investigar valores sem glorificá-los ou condená-los, mantendo objetividade. Ele propôs que juízos de valor não são universalmente verdadeiros ou falsos, pois não são aceitos por todos. A pesquisa deve ser objetiva e baseada em evidências, evitando influências pessoais ou ideológicas. O primeiro termo (juízo de fato) é uma ferramenta de descrição objetiva da realidade, enquanto o segundo (juízo de valor) expressa avaliações subjetivas, muitas vezes baseadas em crenças pessoais. O juízo de fato, também conhecido como descritivo, é uma declaração objetiva da realidade, podendo ser verificada como verdadeira ou falsa. É fundamental para a ciência, pois está ligado à observação e descrição imparcial de eventos. A veracidade do juízo de fato depende da existência da realidade descrita. Este tipo de juízo, baseado em fatos e evidências observáveis, atribui significado à realidade de acordo com a percepção do indivíduo, sem ser influenciado por valores pessoais ou crenças morais. O juízo de valor é uma avaliação subjetiva baseada em critérios de valor, como bom ou ruim. Está relacionado a gostos, percepções individuais e pode ser influenciado por fatores culturais, sentimentais e pessoais. É comum em áreas como moral, arte, política e religião, baseado em crenças e valores individuais. Diferente do juízo de fato, não se baseia apenas em fatos observáveis, mas também em interpretações e valores pessoais, tendendo ser influenciado por emoções e preconceitos, afetando a imparcialidade e deixando de buscar descrever a realidade, mas, passando a avaliá-la, podendo até mesmo realizar proposições normativas.
Críticas e Interpretações
A ideia de “neutralidade” axiológica é, de acordo com Sell (2020), um gerador “polêmicas e tantos mal-entendidos na história do pensamento sociológico”. Isso se dá pela própria natureza heurística do conceito proposto por Weber que deu origem à expressão famosa. Como demonstrado por Sell (2020), temos na constituição do conceito de Werturteilfreiheit um composto de três outros conceitos independentes: Wert (valor); Urteil (julgamento); e Freiheit (liberdade). Das combinações, argumenta Sell (2020), há uma certa tendência na literatura de se constituir termos binários a partir dos três termos, por exemplo, combina-se Wert e Urteil para a ideia de “juízo de valor”, ou Wert e Freiheit para a ideia de “liberdade em relação à valores”, a qual, nos lembra Sell (2020), transliterou-se para a forma anglófona value Neutrality ou ethical Neutrality, e para a forma lusófona como a conhecemos hoje: “neutralidade axiológica”. Uma vez que a ideia de “neutralidade” não está presente no conceito original expresso por Weber, Sell (2020, p. 20) prefere adotar a expressão “liberdade frente à juízos valorativos” para traduzir Werturteilsfreiheit. A escolha tem uma forte implicação tanto na dimensão epistemológica quanto na sociológica, pois elimina radicalmente quaisquer dúvidas sobre se Weber recomendava qualquer tipo de eliminação de implicações valorativas na produção do conhecimento nas ciências da cultura.
Referências Bibliográficas
COHN, G. Apresentação: o sentido da ciência. In: WEBER, M. A “objetividade” do conhecimento nas ciências sociais. Org. Gabriel Cohn. São Paulo: Ática, 2010. p. 7–12.
SELL, Carlos E. Para além do mal entendido da “neutralidade axiológica”: o modelo crítico de Max Weber. In: SENEDA, Marcos C.; CUSTÓDIO, Henrique F. Faria (org.). Ciência como vocação: racionalidades e irracionalidades no velho e no novo mundo. Porto Alegre: Editora Fi, 2020. Cap. 1. p. 19-56. Disponível em: https://philarchive.org/archive/SENCCV. Acesso em: 20 abr. 2024.
WEBER, M. A “objetividade” do conhecimento nas ciências sociais. Org. Gabriel Cohn. São Paulo: Ática, 2010.
Como citar este verbete:
CARVALHO, Marcio J. R. de. Neutralidade Axiológica: Verbete. In: Enciclopédia Max Weber. 2024. Disponível em: https://www.enciclopediamaxweber.org/%C3%ADndice-geral-de-entradas/neutralidade-axiol%C3%B3gica Acesso em: dd.mm.aaaa.